Terraformando tudo - parte 2
Veja os outros posts da série:
Olá!
Estamos aqui novamente para dar continuidade na série de posts Terraformando Tudo. Nesse segundo post da série (se não leu o primeiro, leia aqui), vamos falar mais um pouco sobre os códigos do Terraform, ou Terraform configuration (como o próprio projeto chama uma porção de código executável do Terraform). Também vamos mostrar como o Terraform controla o estado de seus resources e como mitigar as chances de desastres em um cenário onde podem haver diversas pessoas trabalhando no mesmo repositório de configurations
Terraform configurations
Seguindo a nomenclatura supracitada, a partir deste ponto, vamos chamar um código do Terraform de configuration (apesar de aqui no Elo7 chamarmos de ‘módulo’, pra facilitar :P).
Conforme foi citado no primeiro post, o Terraform utiliza uma linguagem proprietária chamada HCL (Hashicorp Configuration Language). A seguir, temos um exemplo de configuration mínimo que pode ser executado com o Terraform. Alguns detalhes estão em formato de comentário no código:
main.tf
# Define o provider que será utilizado e os parâmetros necessários
# No caso, usaremos a AWS na region us-east-1 e as credenciais, como não foram
# explicitadas, irão ser obtidas de variáveis de ambiente ou do arquivo credentials do awscli
# (como default na maioria das bibliotecas da AWS)
provider "aws" {
region = "us-east-1"
}
# Aqui estamos utilizando a funcionalidade de data-sources do Terraform, que traz
# informações de recursos já existentes. Nesse caso, estamos obtendo informações
# da imagem (AMI) mais recente do CoreOS stable da AWS
data "aws_ami" "coreos-stable-latest" {
most_recent = true
filter {
name = "name"
values = ["CoreOS-stable*"]
}
filter {
name = "virtualization-type"
values = ["hvm"]
}
# ID do owner da AMI no AWS AMI Marketplace
# (colocado hardcoded aqui para facilitar este exemplo)
owners = ["595879546273"]
}
# Criando um security-group para a instância
resource "aws_security_group" "elo7-sg-example" {
name = "elo7-example"
description = "SG de exemplo para o post no Blog"
vpc_id = "vpc-123456"
# A regra a seguir libera saída para qualquer destino em qualquer protocolo
egress {
from_port = 0
to_port = 0
protocol = "-1"
cidr_blocks = ["0.0.0.0/0"]
}
ingress {
from_port = "22"
to_port = "22"
protocol = "tcp"
cidr_blocks = [ "192.168.10.0/21" ]
}
}
# Aqui, estamos definindo uma instância no EC2
resource "aws_instance" "elo7-ec2-example" {
# Estamos referenciando o ID da AMI que foi setado no bloco anterior
ami = "${data.aws_ami.coreos-stable-latest.id}"
instance_type = "t2.small"
key_name = "example-key"
subnet_id = "subnet-123456"
# Estamos referenciando o ID do security-group criado nesse mesmo arquivo
# O Terraform cuidará de organizar as interdependências
vpc_security_group_ids = [ "${aws_security_group.elo7-sg-example.id}" ]
root_block_device {
volume_type = "gp2"
volume_size = "15"
delete_on_termination = true
}
tags {
"Name" = "elo7-ec2-example"
}
}
Com a configuration acima, conseguimos criar um Security Group e uma instância na região us-east-1 da AWS. Podemos ver que o pattern para criação de recursos com o Terraform é sempre este: resource "tipo_do_resource" "nome_do_resource"
.
Um outro detalhe é que, para ajudar na organização, poderíamos definir os resources em arquivos separados dentro do mesmo diretório, por exemplo: main.tf
, security-groups.tf
e ec2.tf
. Isso não altera a maneira com que o Terraform irá executar seu código.
Para aplicar o que está descrito no código são necessários 2 comandos:
terraform plan
: Mostra um plano de execução, ou seja, diz o que será adicionado, o que será modificado e o que será removido da sua infra baseado no configuration encontrado no diretório onde esse comando é executado. Esse comando é opcional, mas de extrema importância para sabermos se a mudança é realmente o que estamos esperando.terraform apply
: Aplica as mudanças de fato. Se não houve nenhuma modificação desde o momento do plan, as mudanças que foram mostradas por ele serão aplicadas neste momento.
Estado de um resource
O Terraform controla o estado dos resources contidos em um configuration em um arquivo JSON. Esse arquivo deve ser manipulado apenas pelo próprio Terraform. Ele utiliza esse arquivo para fazer comparações entre o estado existente (em disco ou armazenado remotamente), o estado que o código espera e o estado existente no provider (AWS, no nosso caso). Por padrão, esse arquivo é criado junto com os arquivos .tf
e possui o nome terraform.tfstate
O estado dos resources criados no exemplo anterior fica desse jeito (várias linhas foram omitidas):
{
"version": 3,
"serial": 4,
"lineage": "95a8a54a-f153-435e-b5fa-df66fd3c2c57",
"modules": [
{
"path": [
"root"
],
"outputs": {},
"resources": {
"aws_instance.elo7-ec2-example": {
"type": "aws_instance",
"depends_on": [
"aws_security_group.elo7-sg-example",
"data.aws_ami.coreos-stable-latest"
],
"primary": {
"id": "i-0c2d521d1861a806d",
"attributes": {
"ami": "ami-7ee7e169",
"availability_zone": "us-east-1b",
"id": "i-123456",
"instance_state": "running",
"instance_type": "t2.small",
"key_name": "example_key",
"private_ip": "192.168.10.111",
"security_groups.#": "0",
"subnet_id": "subnet-123456",
"tags.%": "1",
"tags.Name": "elo7-ec2-example",
"user_data": "1c338728002999224f8c8283650db76768b34112",
"vpc_security_group_ids.#": "1",
"vpc_security_group_ids.3439610007": "sg-123456",
}
}
},
"aws_security_group.elo7-sg-example": {
"type": "aws_security_group",
"depends_on": [],
"primary": {
"id": "sg-123456",
"attributes": {
"description": "SG de exemplo para o post no Blog",
"egress.#": "1",
"egress.482069346.cidr_blocks.#": "1",
"egress.482069346.cidr_blocks.0": "0.0.0.0/0",
"egress.482069346.from_port": "0",
"egress.482069346.prefix_list_ids.#": "0",
"egress.482069346.protocol": "-1",
"egress.482069346.security_groups.#": "0",
"egress.482069346.self": "false",
"egress.482069346.to_port": "0",
"id": "sg-123456",
"ingress.#": "1",
"ingress.2063172013.cidr_blocks.#": "1",
"ingress.2063172013.cidr_blocks.0": "172.16.0.0/16",
"ingress.2063172013.from_port": "22",
"ingress.2063172013.protocol": "tcp",
"ingress.2063172013.security_groups.#": "0",
"ingress.2063172013.self": "false",
"ingress.2063172013.to_port": "22",
"name": "elo7-sg-example",
}
}
},
"data.aws_ami.coreos-stable-latest": {
"type": "aws_ami",
"depends_on": [],
"primary": {
"id": "ami-7ee7e169",
"attributes": {
"architecture": "x86_64",
"description": "CoreOS stable 1185.5.0 (HVM)",
"hypervisor": "xen",
"id": "ami-7ee7e169",
"image_id": "ami-7ee7e169",
"image_location": "595879546273/CoreOS-stable-1185.5.0-hvm",
"image_type": "machine",
"most_recent": "true",
"name": "CoreOS-stable-1185.5.0-hvm",
"state": "available",
"virtualization_type": "hvm"
}
}
}
},
"depends_on": []
}
]
}
É com esse estado que o Terraform decide o que deve ser feito, baseando-se no código e também no que já existe no provider (no nosso caso, na AWS). Também é possível gerar o estado de uma infra já existente no seu provider… (mas isso ficará para um próximo post dessa série ;)).
Com esse mecanismo, o controle dos resources funciona muito bem, porém, detectamos um problema. O Terraform gera um arquivo terraform.tfstate
no diretório do configuration ao rodar o terraform apply
. Isso é gerado em runtime, e se pensarmos de maneira distribuída, com vários desenvolvedores alterando os configurations, isso pode ser bem ruim. Afinal, se algum desenvolvedor não possuir o estado atual dos resources de um determinado configuration ao executar um apply, a infra será recriada pelo Terraform (até onde for possível, pois alguns resources não permitem duplicidade). Isso pode causar catástrofes em alguns casos, como um registro de DNS sendo sobrescrito e indisponibilizando alguma aplicação. E essa é uma situação que queremos bem longe da gente.
A próxima seção discutirá sobre como mitigar esse problema.
Estado centralizado
Se estamos falando de um estado, logo esperamos que ele seja consistente. Para tal, o estado deve ser armazenado em um local centralizado. E foi isso que fizemos para nos ajudar com o problema que foi citado anteriormente.
A solução óbvia, baseando-se no que já foi visto - estamos lidando com código (IaC) e o estado do Terraform nada mais é que um JSON (ou seja, mais texto) - seria versionar o estado junto com o código da infraestrutura, e assim mantê-lo centralizado no repositório do nosso controle de versão.
Inicialmente isso pode parecer uma boa ideia, mas ela oferece um grande problema pra nós: trabalhamos com branches, e caso dois desenvolvedores abram uma branch, cada um de um mesmo configuration, ao fazer um teste ou aplicar o que está na branch, o estado entre elas e a master vai ficar inconsistente, ou seja, voltamos ao problema do estado distribuído. Mesmo em um caso onde exista apenas uma branch, ao modificar seu estado e fazer um merge na master, estaremos nós mesmos modificando o estado do Terraform e isso é errado (lembram-se que no começo do post foi dito que o estado só deveria ser manipulado pelo próprio Terraform, né?).
A melhor solução seria termos o estado do configuration guardado em um ponto central, onde, independente da branch na qual os desenvolvedores estão fazendo alterações, um único estado será modificado. E o Terraform, como boa ferramenta que é, pode nos ajudar com isso.
O Terraform possui a funcionalidade chamada Remote State que, como o nome já diz, permite com que o estado seja guardado em um local remoto centralizado. O Terraform dá suporte a algumas ferramentas para armazenar o estado, como o Consul e o S3 da AWS.
Para nós, centralizar os estados dos configurations no S3 fez mais sentido. Conseguimos fazer isso adicionando o seguinte bloco em nossos configurations:
terraform {
backend "s3" {
bucket = "${S3_BUCKET}"
key = "${S3_OBJECT}"
region = "${S3_BUCKET_REGION}"
# O Terraform também oferece a opção de utilizar uma tabela no DynamoDB (https://aws.amazon.com/pt/dynamodb/)
# como lock para o estado em questão, evitando condições de corrida no arquiv.
lock_table = "terraform_state_locking"
}
}
Com isso, automaticamente, a cada plan
e/ou apply
do Terraform nas estações de trabalho dos desenvolvedores, um único arquivo de estado é modificado, e conseguimos manter nosso estado em um local centralizado para cada configuration.
Uma dica para quem for utilizar o S3 como local de armazenamento para os estados é que o bucket tenha a opção de versionamento ativada, pois isso pode ajudar a corrigir possíveis inconsistências nos estados.
Uma outra grande vantagem que o uso de Remote States oferece é a possibilidade de referenciar os outputs
de um configuration em outro sem correr riscos de alterações indevidas. Isso pode ser feito com o resource terraform_remote_state.
Um exemplo de como obtemos os IDs das zonas do Route53 para podermos criar novos registros em um configuration:
data "terraform_remote_state" "route53" {
backend = "s3"
config {
bucket = "BUCKET_NAME"
key = "BUCKET_NAME/route53/route53.tfstate"
region = "BUCKET_REGION"
}
}
Assim, conseguimos referenciar de maneira read-only o ID que precisamos para criação de um novo registro (lembrando que só é possível referenciar o que foi explicitamente exportado no módulo de origem):
resource "aws_route53_record" "dns-public-web-app" {
zone_id = "${data.terraform_remote_state.route53.zone01.id}"
name = "public-web-app.elo7.com.br"
type = "A"
ttl = "300"
records = ["${aws_instance.public-web-app.private_ip}"]
}
Limitações
Utilizar o Remote State com o Terraform alivia bastante os problemas de desenvolvimento paralelo dos configurations que foram citados até aqui. Porém, ainda devemos tomar alguns cuidados ao lidar com esse modelo.
Temos o seguinte cenário de exemplo:
- configuration:
public-web-app
, que já possui uma série de resources criados, como instâncias, banco de dados, registros DNS, etc.
Desenvolvedores criam as seguintes branches:
- Dev 1 cria branch:
adiciona-ALB
- Dev 2 cria branch:
adiciona-discos-para-logs
Supondo que o Dev 1 trabalhe em sua branch primeiro, e adiciona um ALB (Application Load Balancer) no configuration do public-web-app
. Nesse momento, o estado desse configuration vai possuir informações sobre o ALB criado.
O Dev 2, por sua vez, vai fazer suas alterações. Porém, no momento que ele criou sua branch, o código do ALB criado pelo Dev 1 ainda não existia, mas tais informações existem no estado. Então, o Dev 2 vai fazer suas alterações, e vai executar o terraform plan
.
O plano mostrado pelo Terraform para o Dev 2 dirá que os discos que ele adicionou serão provisionados e attachados nas instâncias pois, obviamente, tais resources não existiam no estado. Entretanto, algo estranho também aparecerá para o Dev 2: o Terraform o informará que irá remover um ALB, pois ele encontrou tal resource no estado e não no código.
E agora? Como lidamos com as limitações?
O Terraform não é capaz de controlar mudanças distribuídas (a Hashicorp possui uma versão Enterprise do Terraform que oferece esse controle centralizado). Então, a opção mais barata e direta é termos processos de uso da ferramenta:
- Quebramos os nossos configurations por aplicações (às vezes uma aplicação possui mais de um configuration, caso ela tenha muitas dependências): isso diminui bastante as chances de existirem dois desenvolvedores alterando o mesmo configuration simultaneamente;
- Caso a branch seja antiga, um rebase da master resolve o problema, pois novas alterações que já foram mergeadas são aplicadas na branch atual;
- Em último caso, utilizamos o argumento
-target=
do Terraform, que permite passar exatamente quais resources queremos que sejam modificados. No caso do exemplo anterior, o Dev 2 poderia apontar os seus discos no-target=
e rodar umterraform apply
. Assim, seus discos seriam criados e o ALB continuaria intacto. - Vale salientar, também, que o que está sendo desenvolvido em uma branch, mesmo que aplicado, não é considerado “em produção”. O ambiente de produção é considerado aquele que está na master do repositório, ou seja, um
terraform apply
na master não deve nunca causar nenhum dano às nossas aplicações.
Conclusões
Nesse post mostramos como o Terraform se organiza internamente com a infraestrutura que ele controla, e como trabalhamos de maneira distribuída com os configurations. Também citamos alguns procedimentos que usamos para diminuir os problemas que as limitações do modelo trazem.
Por enquanto o método de trabalho descrito aqui está nos atendendo muito bem. Mas temos em mente que podemos chegar a uma escala em que esse método não será suficiente. Quando isso ocorrer, vamos pensar em outras abordagens, como desenvolver uma ferramenta interna para controle de modificações em paralelo ou até mesmo contratar o serviço oferecido pela Hashicorp.
Finalizamos, então, mais um post da série Terraformando Tudo. Mas ela ainda não terminou! Voltaremos aqui em um próximo post, mostrando o que fazer com a infraestrutura já existente! Podemos “terraformá-la”? Veremos!