Subindo uma aplicação no Kubernetes usando o Helm
Talvez o Kubernetes seja, hoje, um dos nomes mais famosos do mercado quando falamos em DevOps, e não é para menos. A plataforma é uma grande facilitadora quando se trata de gerenciar a infraestrutura de aplicações, tornando muito mais fáceis tarefas como escalar as instâncias, automatizar o deployment e até mesmo gerenciar o ciclo de vida das aplicações baseadas em Docker.
Apesar de todos os benefícios, ainda há algumas coisas trabalhosas no dia a dia de quem trabalha com Kubernetes. Todos os recursos criados no Kubernetes são baseados em arquivos YAML, então como garantir que todos os arquivos necessários para rodar uma mesma versão da sua aplicação estejam sincronizados caso haja a necessidade de, por exemplo, um rollback? Como saber todos os recursos que foram criados para uma mesma aplicação caso seja necessário removê-la? Como ter exatamente o mesmo arquivo tanto para deployments de desenvolvimento quanto de produção, e mudar somente os valores que variam entre um e outro?
E é exatamente nesse procedimento de gerenciamento de pacotes das nossas aplicações que o Helm brilha. A ideia deste post é demonstrar como subir uma aplicação simples usando o Helm, e demonstrar algumas funcionalidades deste gerenciador de pacotes para Kubernetes. Prontos?
A nossa aplicação
Para manter tudo bem simples, iremos subir uma aplicação sem muitos recursos: um contêiner do NGINX que irá expor um endpoint na porta 80.
Preparando o ambiente
Em um cenário real, estaríamos utilizando um cluster de Kubernetes em alguma nuvem — possivelmente o Amazon EKS ou o Google Kubernetes Engine — mas como o foco deste tutorial está em criar nossa aplicação usando Helm, iremos utilizar o Minikube, que é uma maneira prática de rodar localmente um cluster de Kubernetes completamente funcional.
Como estou usando o Linux, é possível subir o Minikube usando o próprio Docker com o comando minikube start --driver=docker
. Isso vai fazer o Docker subir as imagens necessárias para o funcionamento do Minikube. Uma vez executado, é possível rodar o comando kubectl get pods
para nos certificarmos de que o cluster local foi criado com sucesso.
Até a versão 2 do Helm, era necessário subir um componente chamado Tiller no cluster de Kubernetes onde iríamos instalar os nossos Helm charts. A partir da versão 3, no entanto, ele já funciona como um componente isolado, sendo necessário somente executá-lo localmente. No nosso caso, iremos utilizar uma imagem docker que já contém o executável do Helm, então basta executar o comando docker run -ti --rm -v $(pwd):/apps -v ~/.kube:/root/.kube -v ~/.helm:/root/.helm -v ~/.minikube:/root/.minikube --entrypoint=sh alpine/helm
dentro da pasta de sua preferência. Execute o comando helm list
para verificar se o Helm está sendo executado com sucesso.
Obs.: Caso ocorra o erro invalid configuration: unable to read client-cert
ao executar o comando helm list
, pode ser necessário alterar o arquivo ~/.kube/config
para apontar os arquivos de certificado do Kubernetes para um path relativo. Exemplo:
Antes
- name: minikube
user:
client-certificate: /home/rodrigo/.minikube/profiles/minikube/client.crt
client-key: /home/rodrigo/.minikube/profiles/minikube/client.key
Depois
- name: minikube
user:
client-certificate: ../.minikube/profiles/minikube/client.crt
client-key: ../.minikube/profiles/minikube/client.key
Caso isso ainda não dê certo, é possível instalar o Helm localmente.
Criando nosso Helm Chart
O Helm estrutura nossas aplicações em releases. Em um ambiente de produção, onde haja vários releases já criados, o comando de listagem deve retornar algo do gênero (modifiquei o formato para facilitar a leitura):
NAME: hello-helm
NAMESPACE: default
REVISION: 3
UPDATED: 2020-04-16 18:03:33.648387866 +0000 UTC
STATUS: deployed
CHART: hello-helm-0.1.0
APP VERSION: 0.0.11
Cada um desses releases é definido a partir de um conjunto de pastas e arquivos que o Helm chama de charts. Este conjunto de pastas e arquivos tem uma estrutura previamente definida, que é a seguinte:
├── hello_helm
│ ├── Chart.yaml
│ ├── templates
│ ├── deployment.yaml
│ ├── values.yaml
Vamos começar pelo principal: o arquivo Chart.yaml
. O conteúdo dele é o seguinte:
apiVersion: v2
name: hello-helm
description: Meu primeiro Helm chart!
type: application
version: 0.1.0
appVersion: 0.0.0
Este arquivo define, basicamente, três coisas: qual será o nome do chart, a versão dele e a versão da aplicação, que é opcional. Aqui, iremos optar por utilizar o appVersion
para informar qual a versão da aplicação que está rodando. Desta forma, sempre que alguém executar um helm list
, será possível ver a qual versão da aplicação está associado um determinado release, deixando não só operações como o rollback muito mais simples, mas também dando mais visibilidade.
Em seguida, temos a pasta templates
. Dentro dela, devemos colocar todos os arquivos que definem os recursos que iremos utilizar na nossa aplicação. No nosso caso, iremos criar um arquivo chamado deployment.yaml
, que irá definir um recurso do tipo Deployment
no Kubernetes:
# deployment.yaml
apiVersion: apps/v1
kind: Deployment
metadata:
name: nginx-deployment
spec:
selector:
matchLabels:
app: nginx
replicas: {{ .Values.replicas }}
template:
metadata:
labels:
app: nginx
spec:
containers:
- name: nginx
image: nginx:{{ .Chart.AppVersion }}
ports:
- containerPort: 80
Mas o que são esses valores entre {{ }}
? Lembra que dissemos lá no começo que gostaríamos de ter a capacidade de ter o mesmo arquivo para servir diferentes ambientes? O Helm, além de ser um gerenciador de pacotes, possui um poderoso motor de templates baseado na linguagem de template do Go, e esses símbolos são os placeholders que definimos para dizer que, naquele determinado ponto do arquivo, iremos utilizar um valor externo. No caso do nosso deployment, essa informação vem de dois lugares diferentes: da propriedade appVersion
no arquivo Chart.yaml
que criamos mais cedo, e do arquivo values.yaml
.
Este arquivo não possui nenhum formato pré-estabelecido e pode ter qualquer nome. Ele é simplesmente um YAML onde colocamos todas as variáveis utilizadas no nosso template. Como a única propriedade que iremos colocar por enquanto é quantidade de réplicas que nossa aplicação irá ter, nosso arquivo fica assim:
replicas: 2
Pronto! Acabamos de criar o nosso chart! Simples, né? Vamos ver como fazemos para instalar?
Instalando seu chart
A instalação do chart pode ser feita de diversas formas. Aqui, iremos realizá-la em dois passos:
- Gerar um pacote contendo todos os arquivos
- Instalar o pacote no cluster
Passo 1 - Gerando o pacote
Um pacote do Helm é nada mais nada menos que um arquivo .tar.gz
contendo todos os arquivos que fizemos anteriormente. Para gerá-lo, precisamos executar o seguinte comando:
helm package hello_helm --app-version 1.17.10
Isso irá gerar um arquivo local chamado hello-helm-0.1.0.tar.gz
. Perceba que colocamos o número da versão da aplicação já nesta parte do processo. Mas por que isso acontece? Há uma limitação no Helm que não permite a passagem do parâmetro da versão na hora da instalação da aplicação, então é necessário gerar o pacote já com a versão que queremos instalar.
Passo 2 - Instalando o pacote
Uma vez que já geramos o pacote de instalação localmente, chegou a hora de instalá-lo no servidor. A instalação é tão simples quanto a geração do pacote, bastando executar o seguinte comando:
helm upgrade hello-helm hello-helm-0.1.0.tar.gz --values values.yaml --install
Este comando diz para o Helm criar um release chamado hello-helm
, que irá conter os arquivos do pacote hello-helm-0.1.0.tar.gz
e irá se basear nos valores do arquivo values.yaml
. A opção --install
diz para o Helm que, caso não haja um release com este nome, ele deve realizar a instalação.
Neste comando também é possível passar valores dinâmicos que não tenham sido colocados no arquivo passado na opção --values
. Isso é feito passando a opção --set
no mesmo comando. Exemplo: --set replicas=3
.
Se executarmos o comando kubectl get pods
para listar os pods no nosso cluster, os dois pods rodando o contêiner do NGINX devem estar rodando com sucesso!
$ kubectl get pods
NAME READY STATUS RESTARTS AGE
nginx-deployment-cc5db57d4-6dttc 0/1 ContainerCreating 0 15s
nginx-deployment-cc5db57d4-zlg4v 0/1 ContainerCreating 0 15s
Fase bônus
Rollback
Vamos supor que uma nova versão do NGINX tenha saído, e nós queremos fazer o upgrade. Ok, usando o que aprendemos, é só rodar:
helm package hello-helm --app-version 1.18
helm upgrade hello-helm hello-helm-0.1.0.tar.gz --values values.yaml --install
Atualização feita com sucesso! Mas e se começarmos a ter erros com essa nova versão? Com o Helm, fica muito fácil resolver este problema. Se executarmos o comando helm history hello-helm
, conseguimos ver um histórico de todas as versões que foram instaladas naquele cluster.
REVISION UPDATED STATUS CHART APP VERSION DESCRIPTION
1 Mon May 18 18:05:00 2020 superseded hello-helm-0.1.0 1.17.10 Install complete
2 Mon May 18 18:10:40 2020 deployed hello-helm-0.1.0 1.18 Upgrade complete
Vendo todas as versões que foram previamente instaladas, é possível saber para qual versão queremos voltar e podemos executar o comando helm rollback
para voltar para uma determinada revisão:
helm rollback hello-helm 1
Pronto! Nosso histórico agora está assim:
REVISION UPDATED STATUS CHART APP VERSION DESCRIPTION
1 Mon May 18 18:05:00 2020 superseded hello-helm-0.1.0 1.17.10 Install complete
2 Mon May 18 18:10:40 2020 superseded hello-helm-0.1.0 1.18 Upgrade complete
3 Mon May 18 18:13:34 2020 deployed hello-helm-0.1.0 1.17.10 Rollback to 1
Deletando seu release
Esse é bem simples: para remover um release e todos os arquivos associados a ele, basta executar o comando helm delete
:
helm delete hello-helm
Description
Perceberam como, ao ver o histório das versões, temos um descritivo automatizado do que foi realizado naquela versão? Bem, isso também pode ser customizado! Ao gerar o pacote, basta passar a opção --description
!
Happy Helming!